6.4.12

Manhã pálida...

Sentada na varanda da vida, reorganizo o meu pensamento. No horizonte, um mar enublado e triste. Sem céu que o vigie. Sem Olimpo que lhe segrede tons de azul. Deixo-me soerguer discretamente, ora na companhia de uma nuvem ora de uma nesga de sol. Nesta manhã, uma fuga sorrateira por entre transeuntes de bagagem vazia. Deambulavam sem intento. Depressa me senti emersa em grãos de areia e pingos largos de chuva. Aportada e reconfortada, encostei e calei. À minha volta, uma vastidão de silêncio. Um deserto de serenatas de maré. Chuva que me cobriu lentamente. E a Maresia. No meu rosto o seu corpo deformado. Sentia-a. Arrepiei-me vezes sem conta. Nos meus pés o frio translúcido da sua água. Nos meus ouvidos, umas notas soltas de mar. Na partitura, a sua brisa, ténue e doce. Inspiradora. Deixo cair algumas lágrimas em segredo. Impunes e salgadas. Vestidas de pele, procuram os braços do oceano. Escorreitas, adormecem em seu regaço. Partem juntos para parte incerta. A chuva parou. No céu, um braço que se estica e me toca. É o recomeço da profecia. É o regresso a casa. Rápido e seguro. E depressa me afastei daquele refúgio.
Tell@

29.2.12

Na escola...

Diariamente, naquele contexto, são necessárias grandes acrobacias para que o impossível nunca ganhe forma. São jovens imprevisíveis e contagiantes. Assumem as suas funções na escola, despidos de vocação e de expectativas. Vão e voltam, remoendo como bonecos articulados. Apenas o mais banal os atraí. Ficam atónitos e completamente irreversíveis no olhar. De surdez permanente, fingem não ouvir. Pequenas avionetas que sobrevoam as aulas, repetidas vezes. Não chegam a aterrar com medo de se envolverem. Só se ensina quem quer aprender. Aprender pressupõe envolvimento, numa partilha permanente. Numa construção equitativa. Serão sinais de tempos modernos?! Ou apenas o resultado de ações sintomáticas, ávidas de um lugar ao sol?! A melodia é sempre a mesma. As vozes desafinadas entoam notas desalinhadas. Eles gritam, falam desnorteados, intentam em delírios, brincam e evocam as suas vontades, com rispidez na alma. Os estudos são secundários, apenas quando o tempo urge. E, mesmo assim, só depois de muito esforço e de sucessivos pedidos. Talvez um dia, dobrado o cabo das Tormentas, possam construir algum projeto de vida.




Tell@

4.2.12

Ao entardecer...


Vestida de mim, numa varanda de madeira sobre o mar.
Na falésia recostada, enquanto sinto o sol brilhar.
Vazia na alma, mas percorrida pela sua grandeza sublimar.
de olhos perdidos, sentada num seu patamar.
Inspiro e expiro, num profundo libertar.
Não obstante, insisto no teu pensar.

Tell@

15.1.12

Perdão.

Mais uma vez, de forma atroz, senti o quanto pequenina sou neste mundo. Senti o chão fugir-me dos pés e, mesmo assim, continuei a palmilhá-lo como se nada tivesse acontecido. Não há solução que nos alivie esta dor. Ela invade-nos e devora-nos lentamente. O pior é pensarmos que o mal só acontece aos outros. Esquecemos de olhar para o lado. Para aqueles que estão mais perto de nós. Que são sangue do mesmo sangue. Ou quase. Aqueles que nunca vão, senão temporariamente. Hoje fiquei sem chão. Perdida entre a realidade absoluta e aquela que imaginamos ou desejamos. De facto, não somos nada neste mundo. Pequenos e insignificantes nas mãos ou desígnios de alguém muito superior a nós. Pedi que o tempo parasse contudo, esta tarefa não está ao meu alcance. Há muito que o sabia mas, dentro de mim, no meu mais intimo não o desejava. Depois de sermos tão violentados intimamente ao longo da nossa vida, passamos a acreditar que mais nada de mau vai acontecer. Cerramos os olhos e desejamos veemente por melhores momentos. Intenções que não passam disso mesmo. Olho em redor, tento imaginar-me na dor de cada um, numa vã tentativa de evitar a solidão. Queria poder ajudar milagrosamente. Mas só a Deus cabe tal incumbência. Somos mesmo demasiado pequeninos. Insignificantes. Preocupados com a nossa dor mais do que com a dos que amamos. Preocupados com o olhar dos outros, como se estes fossem importantes. Sobrevivemos num mundo de egoístas e altruístas, incapazes de parar e de pensar. Nele me incluo. Hoje perdi um pedaço do meu chão. Amor é muito mais e um gesto maior. Vem do coração, da alma e aconchega. Ajuda a acalmar e aceita. É olhar quem amamos, direitos ao coração, e pedir perdão ou perdoar. Sem vacilar, procurando paz na alma. São gestos simples, sem retorno. É entrega total sem necessidade de agradecimento ou compreensão. E é no aconchego de quem amamos que nos reencontramos. Quer queiramos, quer não. Onde nos sentimos muito mais seguros. Aninhados de novo, como no ventre materno. Perdoar e aceitar só está ao alcance de alguns. Não que não possamos mas, porque nos esquecemos do que somos feitos ou daquilo que nos faz doer. O mais importante é vivermos em harmonia connosco e com Deus. É importante que não nos esqueçamos que para atingirmos os nossos objectivos temos de saber perdoar. Estender a mão. Que o perto não significa distancia e que o longe, pode ainda ser mais perto. Aqui mesmo no nosso coração. A nossa vida acontece num palco improvisado e emprestado, por um período muito curto de tempo. Não quero perder quem amo, por sentimento de insegurança. Por cegueira aparente. Por achar que posso ajudar quando sei que não me cabe a mim fazê-lo. Não podemos recuperar os erros, mas podemos evitar que outros nos roubem, de vez, o chão. Hoje perdi o meu. Resta-me lamentar a minha incapacidade de, apenas, abraçar quem amo e reduzir-me à minha insignificância. Nas diferentes formas que existem de amar. Somos tão insignificantes aos olhos de Deus. Tão imensamente pequeninos. Todos nós, sem excepção. Amo poucas pessoas, mas com a mais pura verdade e simplicidade que guardo no meu peito. Os meus e os dos outros. Pessoas únicas e singulares. Mas nenhuma como a minha querida mãe. A minha luz. Preciso dizer-lhe tudo isto urgentemente. Ao ouvido, ou no seu colo.


Tell@

2.1.12

No frio do meu calor...

Rompe a aurora num estado de chuva miudinha. Dia triste e sem sentido. Despeço-me, alma errante porque está na hora de partir. É sempre longe de mais, quando a partida é forçada. Olho o céu, repleto de nuvens, e dispo o meu peito. A dor irrompe o meu corpo. A música, em marcha lenta, acena despedindo-se. Não existem carpideiras nestas alturas. Guardo a lembrança do que sinto. Do que vivi a teu lado. Para sempre, numa rara imagem nostálgica de amor. Inspiro e, de novo, irrorecomeço a chorar. Não me reconheço ao espelho. O vazio que fica de ti, invade-me de forma insultuosa e desvairada. Percorre-me, deixando-me à sua mercê. Nunca terás consciência do que estas despedidas provocam em mim. Da sombra que deixa em meu peito. De ti fica apenas o silêncio das palavras que invocaste. Dos teus gestos, sorriso e cheiro a mar. Vieste e estiveste de novo. E, de novo, partiste deixando-me para trás. Entregue a pensamentos e desejos ávidos de ti. Estou, mais uma vez, desarmada. Vacilo e procuro, no refúgio do meu lar, um recanto que me aconchegue. O dia, apesar de claro, começou escuro e triste. Vazio. Mesmo sabendo que tudo na vida é cíclico, esquecemo-nos que aquilo que existe hoje, amanha não passa de uma miragem. Nada é definitivo nem acontece ao tamanho dos nossos desejos e necessidades. Fecho a porta. Sinto frio, apesar de agasalhada.


Tell@

30.12.11

Mais um ano vencido. Na esperança de uma vida melhor, o enfoque encosta-se, lentamente, à sensação tática de mudança. Uma mudança que dá entrada livre ao novo ano civil. O concerto estreia-se e, no palco do tempo, ressoam as doze badaladas que anunciam a entrada de 2012. Trajado a rigor, o novo ano, brinda-nos com o seu sorriso antecipado. Dos bastidores ao palco, vagueia enquanto devora o texto representativo do seu papel enquanto ator principal. Por entre palavras de coragem, dá forma a vários desejos. Oferece votos singulares, enquanto protagonista e vigia constante dos nossos atos. Promete evocar os nossos sonhos, sentindo-os como seus. Dar-lhes vida para que, em nós, nos seduzam e alimentem o estado de espírito. Ainda, oferece-nos um presente vitalício de relevante importância. A certeza de dias melhores…

Tell@

29.7.11

mundos (im)perfeitos!

Pedem-nos que sejamos perfeitos. Entre tantos nós imperfeitos, acabamos por bloquear. Entre palavras normais e assertivas, calam-se as ideias que vagueiam em forma de pensamento aluado. Nem mesmo a criatividade já é o que era. Agir sem autonomia mantendo a mesma rotina é uma tarefa demasiado controlada. Odeio a rotina e todos quantos a aplaudem. A rotina inibe-me e despe-me completamente. É preconceituosa. É matreira. Alimenta-se de vícios, alienando-nos. Para não perderem o controlo da situação, preferem ser seus escravos. Deleitam-se à sua sombra, errantes. Neste castelo, a magia só acontece uma vez por ano, e sempre da mesma forma. Com o mesmo sabor e o mesmo cheiro. Corrosiva e trapaceira, inviabilizando todo e qualquer voo.
Discordo deste formato de vida. O pensamento não deve ser condicionado pela acção. Este deve vaguear e percorrer-nos na pele, por entre veias, ao longo do nosso sentir. Quero voar em pensamento. Imaginar e dar forma às ideias que pululam dentro de mim. Sem vacilar. Sem rodeios nem intempéries. Sonhar é um acto livre. Mesmo que não passe do papel. Levanto as asas mas quebram-me o voo, por ciúme. Por bloqueio interno. Muitas pessoas nascem e morrem pequeninas e insignificantes. Nem olhando para o lado se inspiraram. O império dos que se sentem absolutos está em estado de ruína. Se não mudarem rapidamente de modelo de acção, agarrando a casa pela estrutura principal, o recomeço tornar-se-á impossível. Pensar, planear e agir com criatividade e imaginação é, cada vez mais, urgente. Mesmo as mais pequenas tarefas exigem o melhor de nós. Exigem novas propostas, invocações, num trabalho de equipa, aceitando as ideias dos outros, respeitando, evidenciando capacidades de liderança. É, no conjunto, que reside a força da verdade e da justiça. Todos remando na mesma direção. (Re)construindo e revitalizando de forma positiva. Na busca da perfeição e da magia da vida. Deixando as ideias fluir. Deixando o pensamento ganhar forma. Partilhando as emoções e as (des)emoções. Num espaço comum. Com vida própria, necessidades vitais, capacidades, ideias e sensações. Não existem mundos perfeitos. Não existem ser autómatos nem robotizados. Somos humanos, erramos, caímos e levantamo-nos. Pedimos ajuda e auxiliamos. Com correcção e visão. Com respeito e carinho.
Urge caminhar neste sentido, sem demora. Mais cego é aquele que não quer ver. Olhar, por si só, não significa ver. E quem não vê, dificilmente sente. O mundo é feito de sensações e contradições. O exterior só nos controla quando o permitimos. É dentro de nós que reside a equação da vida. A resposta para as nossas contrariedades. A cobardia nem sempre nos permite abraçar o inóspito. Em prole da felicidade, escolhemos a segurança. E, quando assim sentimos ou reagimos, por mais que olhemos em redor, tudo será sentido ao nosso tamanho. É na diferença que a nossa criatividade se recompõe. Abraçar a diferença é crescer com ela. Afinal, nem mesmo ao espelho, conseguimos descobrir as diferenças. Há quem, mesmo depois de adulto, não queira deixar o ninho. O pavor inibe. Fá-los permanecer estanques e agarrados a mitos. Presa a ideias erróneas. São pessoas passivas. Receosas, encolhem-se deixando de abrir portas ao desconhecido. Posso respeitar, mas não aceito. Não aceito que alguém se desmaterialize, agarrada às saias do passado, ao invés de partir em busca da sua essência. Nestas alturas, a corrente tem pouca força e quebra com facilidade. As mãos alheias recolhem, cansadas. Choram e lamentam. O esforço foi em vão. Deitadas nos bolsos de umas velhas calças, tristes e encolhidas, voltam a adormecer. Percorrem mais alguns quilómetros, na textura de um volante, sem rumo certo. Afinal, são elas que alcançam, em primeiro lugar, o Mundo do sentir. Num destino sem coordenadas. Desafinado, desorientado mas revestido de sentido. Fecha-se uma porta e abre-se uma janela, mesmo ao fundo do túnel. Olho o mapa desconfiada. Perdi o norte. Um sinal que importa ler. Diz-me ser hora de parar e descansar. Mesmo dentro de mim.
Tell@

24.7.11

Fim de tarde...

Há muito que aqui não vinha. O excesso de trabalho inibiu-me a criatividade e a liberdade de pensar. Apesar de liberta de aulas, a burocracia a que temos sido sujeitos, num processo contínuo de habituação a sucessivos relatórios e documentos legais, transformou-nos em verdadeiros workaholics. Numa viagem surreal através das palavras, ideias, textos e gráficos, vamos tentando registar por escrito o trabalho realizado ao longo do ano e os resultados obtidos. Depois destes, estudos comparativos com anos lectivos anteriores. Com as metas do Agrupamento na linha do horizonte, vamos vagueando por entre frases e textos, parágrafos sem fim. O horizonte é ainda intocável, apesar das medidas e constantes intervenções no sentido contrário. Somos todos falíveis. O fruto só apodrece por si mesmo, num tempo só seu. As horas parecem minutos e estes, quando passam, nem os conseguimos sentir. O ritmo de trabalho tem sido alucinante e devorante de cansaço. A vela arde e derrete lentamente, aguardando por nós. Contudo, em tempos opostos, nem eu nem ela, revertemos o sentido e escolhemos continuar sem parar. Os sinais de trânsito não passam de puras miragens. As férias aproximam-se lentamente. Ainda não estamos prontos para as receber. Contudo, de marmita na mão, PC no horizonte, eis-me relatando em segredo. Ainda faltam dois relatórios específicos, o preenchimento de dois documentos numa plataforma oficial, a construção de um projecto e o preenchimento da minha ficha de autoavaliação (dizem, com elementos dos dois últimos anos de trabalho). Nada de mais. Depois de começar, o resto vem por acréscimo.




Tell@

21.6.11

Mundo insano

Invariavelmente sentida. A mente humana é perversa. Catálogo de viagens surreais. Nada do que se imagina se encaixa com a realidade. Quando duas pessoas caminham em direcções opostas, a corda quebra. São escolhas mal definidas. Jamais devemos reagir sem equacionar os danos provocados colateralmente. Podem ser irremediáveis. Podem provocar dor e calor na mente. Decisões mal tomadas, esmagam sem desdém. Bem-vindos ao mundo real. O individualismo, quando olhado com protagonismo, é sinal de ruptura. Não entendo as razões que levam o ser humano a magoar muito mais quem diz amar. O sangue do seu sangue. Deliberadamente, mais do que fisicamente, magoa psicológica e emocionalmente. Inventando jogos de poder e sedução, cujos resultados são, maioritariamente, insatisfatórios. O ser humano é fonte inesgotável de maus-tratos. Em vez de comunicarem oralmente, mesmo por parcas palavras, optam pela agressão, pelo grito ou ainda por meia dúzia de palavras que rebaixam e reduzem a pessoa a nada. Hoje o dia foi de loucos. Por vários motivos. Acabei a tarde a relatar o incidente da manhã na Comissão de Protecção de Crianças e Jovens. Impotentes, limitam-se a registar, num faz-de-conta contínuo. Infelizmente, neste país, ninguém tem poder para reagir no momento em que é, realmente, preciso. Os processos acumulam-se e, nem o Tribunal de Menores, intervêm com a celeridade necessária. O tempo vai passando, as feridas aumentando e as nossas crianças sofrendo em silêncio. Negligente este país, não só os progenitores, que vai adormecendo as nossas queixas e relatos das crianças que nos rodeiam e que vivem no limite das suas forças, muito perto do precipício.



Tell@

8.6.11

Miséria de dia...

Miséria de dia. Enjaulada, como não gosto nada. E muito menos acamada. Zipando, vou percorrendo todos os canais da TV. Revendo as horas, minuto a minuto. Nem mesmo assim elas passam, voando à velocidade que quero. Meto a quinta mas continuam sem avançar. Hoje não há necessidade de dar corda aos sapatos. São muito mais compridos estes dias vazios de vida. Vazios de pessoas. Vazios de alaridos e de acções. Parcos em palavras alheias. Nem a medicação é remédio santo. Nem a almofada aconchega, de tão farta que estou dela. Dias assim são inúteis. Ao contrário, faltam-me as forças para muito mais. Ou quase nada. Escrevo, ocupando o meu tempo. Na esperança que, através deste texto, algo mágico aconteça. É o tempo que nos transporta. E mesmo acamada, é ele que nos impede de seguir ou inibe de correr. De qualquer forma não tenho pernas para correr. Forças para o fazer. Nariz para o cheirar. Pulmão para o inalar. O melhor é sossegar e esperar. Sentar e calar. Não pensar. Estar comigo mesma. Viro para a esquerda e paro. Para a direita e fixo o olhar. Miséria de dia.

Tell@

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